terça-feira, 4 de agosto de 2009

(lat speculu)

O meu peito deseja e, estranho, persegue as palavras que faltam ao meu truncado sentido. No desassossego, acabei por entender a necessidade da vida/morte das coisas - eu mesmo me dividi em vários pedaços mortos/vivos pouco delimitados. Foi o inverno que trouxe o tempo; o excesso trouxe a maldita sensação de que sei das coisas: não há no mundo alguém mais obstinado em me pertencer que eu, alguém que pretenda mais conhecer-me que este indivíduo que me habita.

É no exame do espelho que o indivíduo me estranha: há alguém neste mundo igual ao eu que imagino de mim? Responde, então, a minha face, que sou eu mesmo a me procurar. Não encontro fundamento, porém, para manifestar a realidade do que vejo ou do que escuto, miúdo, dentro da concha. Aleatoriedades à parte, a perturbação de não conhecer o indivíduo refletido é ainda maior do que a morbidez de negá-lo. Aquele lá, não sou mesmo eu. Aquele lá, não sei quem é.

Demora a superfície a refletir o ser e nesse milésimo de tempo eu mudo infinitamente até que seja outro e não eu. Percebo ainda a ineficácia do espelho que procura um ângulo adequado da imagem, cuja intenção pode ser vagamente especulada. Erro ainda em procurar no objeto em si seu reflexo, sendo ele tudo o que o objeto produz. Culpo o tempo, o espelho e tudo o que há, porque não sou eu o ser mimético refletido. Amargo, o não-eu desaparece do reflexo e me segue. Agora sou eu e minha não-imagem percorrendo o caminho vazio da auto-afirmação. Só porque não gostei do que vi.

6 comentários:

Luiz Felipe Leal disse...

engraçado. sinto uma sinceridade e um alfinete. acho que as coisas mudaram, queria ouvir um diálogo e não te entendo. que belo.

Unknown disse...

sinto por não me fazer entender ou não dialogar, por assim dizer. existem coisas demais por dentro que não querem calar.

Lupe Leal disse...

isso não é, jamais, um defeito.

abraço forte.

DBorges disse...

Martinez!
Até senti saudade de te ler brigando com você. Volta mais adorável do que nunca, e pouco diferente do passado.
Esses seus conflitos internos ainda te levarão pro caixão.

Te acho linda, linda, linda!

Renata Evellyn disse...

Carmem, deus conflitos internos me fazem desmoronar em lágrimas descontroladas, acho que deve ser pq tb me sinto assim. Teus alfinetes me doeram, mas eu sei que mereço. Minha alma precisava de algo assim. Muiiito obrigada.

Circo Golondrina disse...

Nooossa!!! Bom demais isso aí. Tão, TÃO Lispector. Mas fácil de entender, de compreender, de sentir.